Uma São Paulo vazia
É engraçado pensar em como todo bom paulistano sempre sonhou com uma São Paulo vazia. E agora o Coronavírus trouxe esse sonho para a realidade, um fenômeno que a fotografia precisa registrar.
Sei de alguns fotógrafos que saíram para fotografar essa situação. Ricardo Migliorini é um destes, fazendo um trabalho mais autoral. Já Anderson Lira saiu captando imagens para a imprensa, por exemplo.
Mas eu mesmo saí pouco de casa. E todas as vezes que saí, principalmente de carro, capturei algumas imagens com meu smartphone.
Não é o equipamento ideal, mas é o que tinha “para hoje”. E aproveitei um pouco do que vi…
Com a quarentena e o fechamento do comércio e outras atividades comerciais e educacionais, muita coisa mudou, é claro.
Mas acho que o mais impactante na configuração dessa nova cidade é uma espécie de limpeza nessa São Paulo vazia.
Uma nova cidade
Sim, o ar está limpo! Tão limpo que há cerca de uma semana não vejo mais aquela famosa faixa de poluição amarelada que flutuava sobre a cidade nos dias mais secos e quentes.
As estrelas estão brilhando à noite de tal maneira que fica difícil não querer captar constelações impossíveis de reconhecer em tempos normais.
E fotografei o céu noturno de dentro de casa, até mesmo aproveitando essas imagens em um vídeo para um canal do youtube.
E as ruas? É engraçado, mas não vejo mais aquele mar de papéis, tocos de cigarro e até copos descartáveis jogados em todos os lugares.
Será que a prefeitura limpou as calçadas? Bom, a zeladoria da cidade é sempre melhor no centro da cidade do que na periferia.
Isso é triste e nunca mudou…
Ou será que foi o vento gelado da noite que anda arrastando o lixo para outros lugares? Para os bairros, é claro…
Em compensação, alguns personagens urbanos ficaram mais visíveis.
Em uma São Paulo vazia…
Os mendigos ficaram evidentemente expostos.
Agora, quando olhamos um trecho de, digamos, dois ou três quarteirões de calçada de uma região por eles ocupados, ficam praticamente em destaque.
A população de rua não consegue mais ficar escondida por aquela profusão de pessoas que pululavam com suas vidas na grande metrópole.
E dá muita dó, muito mais do que medo…
Outra forma de vida quase alienígena que ocupou a São Paulo em quarentena é a dos entregadores de comida e produtos por aplicativo.
Munidos de seus contêineres coloridos e montando suas motos ou bicicletas, parecem ser a única atividade que ainda se mantém viva.
Enxameados em volta das portas entreabertas de restaurantes que só podem trabalhar por entrega, ou fazendo compras teleguiadas em supermercados e até mesmo padarias, mantém o fluxo dos alimentos para hipsters, Millennials e trabalhadores remotos.
Esses ainda tem trabalho e poder aquisitivo para comprar…
E os idosos? Dividem-se em duas classes: os amedrontados e os intrépidos.
Desses só vejo aqueles que, apesar dos pedidos eloquentes feitos pelos mais jovens de suas janelas encasteladas, saem as ruas para comprar, tomar sol ou passear com o cachorro.
Nunca viram filmes distópicos, não sabem o que é um zumbi, tem muita fé, pouca informação, desesperança com a vida ou tudo isso junto.
E vão vivendo, afinal de contas todo mundo morre mesmo…
Quanto tempo ainda?
Pelo visto essa quarentena ainda vai durar muito.
Eu tenho me alimentado de um trabalho constante em casa, pelo contato distante com as pessoas, com a musica que toco e publico todo dia para ajudar, e até mesmo aqui com esse blog.
É verdade que o mundo da fotografia está praticamente em “modo de espera”, e que fico até sem graça de publicar alguma coisa.
Mas pelo visto vamos sobreviver. Aproveite, e de dentro de sua clausura, fotografe a crise!
PS.: Eu acho ridículo colocar meu nome e data em baixo de cada imagem, mas acreditem se quiser, tem gente que fica perguntando de quem são as fotos, hehehe.
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