Como preencher sua fotografia de Luz
Resolvi escrever um artigo mais inspiracional do que técnico por que fotografar nesses tempos não anda muito fácil.
Ando pensando nisso por causa de vários fatores: o tempo em São Paulo esteve (e está) feio e chuvoso, muita gente está desanimada com a situação do país e eu não ando muito bem do estômago, hehehe.
Meu problema de estômago é emocional (e mediúnico, cruzes!) mas eu confesso que não tinha pensado que o tempo feio não tem muita luz, que as pessoas tristes não tem muita luz e que minha digestão então tem menos luz ainda…
E a fotografia, o que tem a ver com isso? É simples, ela registra a luz conforme o que queremos, ou podemos, olhar!
Uma luz metafórica
Percebi essa ideia de Luz vendo uma palestra no Youtube com o Divaldo Franco. No vídeo ele conta uma fábula sobre um pai que, para escolher qual filho vai receber sua herança, pede que cada um pegue um único espaço da sua casa e o preencha o mais completamente possível, com o menor gasto possível.
O primeiro filho compra toneladas de feno, que é barato, e preenche um quarto até o teto. O pai diz que ele é ótimo negociante e o felicita. Já o outro filho abre a porta de um outro quarto todo fechado, e acendendo um único e barato fósforo o preenche completamente de luz. Esse é o filho sábio e acaba recebendo a herança.
Fiquei com pena do primeiro filho, hehehe, mas a fábula me chamou a atenção para essa Luz, que é uma metáfora, e a luz que eu registro no dia a dia como fotógrafo.
E foi assim que lembrei que há alguns dias atrás estava conversando sobre a questão do belo na fotografia. Tudo começou com uma comparação entre a forma como tratamos os sujeitos da fotografia no Brasil e no resto do mundo…
A luz e o Belo
Já comentei aqui sobre a origem documental e jornalística da maioria dos fotógrafos nacionais. Mais do que artística, a fotografia é entendida por muitos fotógrafos como meio de expressão de ideias de denúncia social, de registro de arbitrariedades e do inconformismo com a situação existente.
Isso é importante (e necessário), no entanto muitas vezes profissionais famosos por seu ativismo como Sebastião Salgado são criticados (veladamente, é verdade) porque seus trabalhos de “denúncia” vem embalados num conceito cada vez mais esquecidos, e mesmo negado: o “belo”!
Sim, as fotos de Sebastião Salgados são lindas, isso é indiscutível. Eu diria que são registros visuais sobre situações de risco que geram perplexidade através da percepção do sublime.
Já que posso, achei melhor teorizar: gerar perplexidade no observador através da promoção de emoções que o levam a percepção de algo sublime era o que se chamava antigamente de “Efeito Glamour”!
Mas aí já demais…vamos à prática?
Dando Luz ao cotidiano
Então que tal algumas dicas de como olhar o mundo em “cor de rosa”:
Perceba o olhar da pessoas que você está fotografando. As vezes uma pessoa que parece estar em situação de risco ostenta um olhar desafiador muito diferente do que se espera de alguém em sofrimento. Na realidade você pode estar fotografando um vencedor como se fosse um perdedor…
Outra situação é quando o seu sujeito deveria se comportar de uma forma, numa determinada situação social, mas se expressa de outra. Captar uma imagem assim gera na imagem um interesse novo, inusitado e na maioria das vezes, divertido.
Perceba a paisagem urbana em seu contexto. As vezes uma região da cidade que parece abandonada e decadente é na realidade um lugar cheio de vida e possibilidades.
No Brasil esse é muitas vezes o caso dos centros das cidades, que tem muita vida durante o dia e são “mortos” à noite. Ou até mesmo ao contrário, caso de algumas regiões industriais que se tornaram em polos de diversão pela grande oferta de espaço e baixo risco de incomodar vizinhos.
Perceba a paisagem do campo em outro contexto. As vezes uma região agrária que parece estar abandonada é apenas um terreno esperando pela devida rotação de cultura ou uma reserva de mata nativa, necessária à preservação de espécies e rotas de migração animais.
Olhe com cuidado e perceba melhor os detalhes em relação à topografia e principalmente, ao céu. Não seja purista e caso necessário utilize os recursos da computação gráfica para valorizar o que pode ser valorizado. Você vai se surpreender.
Valorize a cultura de onde uma pessoa vem. Ao fotografar pessoas em seus lares, trabalho ou lazer enfatize aqueles elementos únicos, que são sofisticados do ponto de vista imagético e que demonstram elementos de composição formais.
Por exemplo, componha suas fotos de modo a valorizar sinais que indicam preferências pessoais, tais como bandeiras de times de futebol, santos e símbolos religiosos, eletroeletrônicos como televisões e smartphones. Enfim use tudo a seu alcance para dar “índice” à foto, ou seja, facilitar o entendimento do contexto pelo observador. Você vai se surpreender como imagens assim são mais vivas, digamos assim.
Não queira apagar a minha Luz
Sabe, eu passei décadas sofrendo todo o tipo de assédio criativo. Eu não podia fotografar nem fazer nada olhando para o melhor das coisas sem que fosse criticado.
Era chato aguentar essas opiniões mas isso não mudou a forma como vejo o mundo. Aliás, estou cada vez mais Polyanna, hehehe.
Então se você vê o mundo como um globo luminoso e cheio de possibilidades, fotografe e valorize mais ainda esse lugar.
Agora, se para você todo dia é um dia pior, desculpe mas acho melhor se tratar…